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domingo, 23 de setembro de 2012

Grandes ecologistas - Rachel Carson

Em comemoração aos 50 anos de "Silent Spring" (Primavera Silenciosa), a grande ecologista de hoje é Rachel Carson...

Rachel Carson

50 anos do livro Primavera Silenciosa: um tributo à Rachel Carson
Roseli Ribeiro, do site Observatório Eco

Nas páginas da prestigiada revista americana, The New Yorker, a denúncia ambiental, sobre o uso de pesticidas que poluía o meio ambiente americano, revelada sob o título “Primavera Silenciosa”, surgiu ao mundo em junho de 1962. Após ganhar repercussão no país recebeu seu formato em livro, publicado em setembro daquele ano.

Para denunciar a poluição ambiental provocada pelo uso indiscriminado de pesticidas nos campos americanos Raquel Carson realizou extensa pesquisa científica e conversou com dezenas de especialistas. Em seu livro, ela conta que já em 1945 conhecia os efeitos desta poluição, porém em 1958 ao receber a carta de uma mulher relatando a devastação de uma região, Carson, embora, gravemente doente, reuniu forças para escrever sobre o tema. Vale lembrar que naquela época, graças à sua sólida carreira como bióloga marinha e por ter escrito o livro “O mar que nos cerca”, Carson já era conhecida do grande público americano.

Na década de 50, nos EUA, muitos cientistas sabiam dos malefícios do DDT usado para eliminar as pragas na agricultura, contudo, antes de Carson esse assunto não havia sido levado ao grande público. Ela por mais de 4 anos realizou uma extensa investigação sobre o tema e sistematizou sua criteriosa pesquisa. Em seu trabalho soube mostrar ao público que não estava acostumado aos termos científicos a relação de causa e efeito que o uso indiscriminado de pesticidas provoca nas plantas, águas, animais e homens.

No livro, a cientista lançou os princípios do que significa a ecologia e de que forma a vida na Terra está conectada a cada elemento. Podemos dizer que graças à Carson, o conceito de ecologia ganhou prestígio. Mas ela foi além, escreveu sobre o direito moral de cada cidadão saber o que estava sendo lançado de forma irresponsável na natureza pela indústria química. E foi mais além, despertou a consciência ambiental de uma nação para reagir e exigir explicações e soluções. 


Carson se importava verdadeiramente com a contaminação provocada pelo uso do DDT e a relação direta com a destruição do meio ambiente, cunhou a expressão de que os inseticidas deveriam ser taxados de “biocidas”. Ela relatou minuciosamente diversos casos de degradação ambiental em seu trabalho. Coletou dados precisos, colheu depoimentos e usou seu talento literário para descrever todo o problema ambiental de modo a sensibilizar as pessoas. Os leitores precisavam, não apenas, compreender a dimensão da contaminação. Deveriam ir além, e exigir soluções do governo e das indústrias, “a população precisa decidir se deseja continuar no caminho atual, e só poderá fazê-lo quando estiver em plena posse dos fatos”, alertou em seu livro. 

Este foi o legado de Rachel Carson, ela não se contentou em apenas relatar objetivamente os fatos, ela lançou sua posição em prol da causa ambiental. Não bastava apenas o público conhecer os efeitos do DDT. Para a autora, os leitores precisavam decidir se queriam continuar convivendo com aquela poluição, e para decidir o cidadão precisaria ter “plena posse dos fatos”, na avaliação da cientista.

Após a publicação do texto na revista The New Yorker, o presidente do EUA na época, John F. Kennedy determinou que o uso do DDT fosse investigado. A rede de televisão CBS realizou um documentário sobre os fatos revelados por Carson. Com isso, a mensagem dela alcançou mais pessoas, permitindo que a mobilização em torno do problema chegasse ao Senado Federal, no qual a escritora em 1963 prestou depoimento aos senadores sobre os efeitos nocivos da contaminação pelo produto. 

Nos Estados Unidos, após a investigação conduzida pelo governo a produção caseira do veneno foi proibida. A criação de leis estaduais e federais ganhou impulso e culminou após alguns anos com a criação no Congresso Nacional da Lei de Política Nacional Ambiental que instituiu a EPA (Agência de Proteção Ambiental). Posteriormente, surgiu uma legislação que garantisse proteção às espécies ameaçadas de extinção. Rachel Carson morreu em 1964, aos 56 anos, vítima de um câncer de mama, doença contra a qual já lutava há vários anos.

A importância do livro Primavera Silenciosa

Michel Frome, ambientalista americano, jornalista e professor, também não esconde a influência e a importância do livro de Carson. Frome desenvolveu nos Estados Unidos, pioneiramente, o programa de jornalismo e redação ambiental da Universidade de Western Washington em Billingham (Washington). Aposentou-se em 1995 e no ano seguinte escreveu “Green Ink: uma introdução ao jornalismo ambiental”, livro considerado fundamental para qualquer curso de jornalismo ambiental. Em 2008, foi traduzido e publicado no Brasil.

Ao abordar a importância de Rachel Carson no jornalismo ambiental, Frome afirma não conseguir pensar em um exemplo melhor de jornalista ambiental, embora reconheça que ela – Carson – jamais teria se considerado uma.

Segundo Frome, ela foi ridicularizada pela indústria de pesticidas que gastou meio milhão de dólares para jogar na lama as denúncias inseridas em “Primavera Silenciosa”. Muitas das conquistas ambientais, que nasceram graças ao seu trabalho, ela não chegou a presenciar.

Em 2000, “Primavera Silenciosa” foi considerada pela Escola de Jornalismo de Nova York uma das maiores reportagens investigativa do século XX. Em 2006, o jornal britânico, The Guardian colocou o nome de Rachel Carson em primeiro lugar na lista das cem pessoas que mais contribuíram para a defesa do meio ambiente.

Outro professor americano, Dale Jamieson no livro “Ética e meio ambiente: uma introdução”, também revela sua admiração à Rachel Carson quando afirma que ela é o tipo de escritora e pensadora que leva as pessoas a agirem, e que nesse sentido pode ser considerada um ícone do movimento ambientalista contemporâneo. 

Exemplo de engajamento ecológico

A obra, “Primavera Silenciosa”, conseguiu mostrar todos os aspectos da contaminação provocada pelo veneno DDT, com base em fatos científicos e apoiado em extensa pesquisa e na opinião de balizados técnicos da época.

Carson sistematizou todas as informações em linguagem acessível ao grande público. Ela transmitiu as bases dos conceitos modernos de ecologia, do princípio da prevenção, ao afirmar que os venenos não poderiam ser lançados na natureza, sem que se soubessem antes os reais efeitos desta prática nos organismos vivos.

Ela argumentou sobre as bases do direito de informação do cidadão sobre as contaminações. Ela lançou a tese de que se o cidadão deve suportar a poluição ele também tem o direito de exigir reparações e providências para a cessação das práticas contaminadoras.

Além disso, Carson demonstrou preocupação genuína sobre os fatos que relatava, usou seu talento literário para envolver e ensinar seus leitores. Escreveu com sentimento pensando nas gerações futuras. O desavisado leitor, que, por exemplo, ler a primeira página que singelamente começa com a frase: “Era uma vez uma cidade no coração dos Estados Unidos onde todos os seres pareciam estar em harmonia com o seu ambiente”, jamais irá supor o resultado desta “fábula para o amanhã”.

Em seu livro, Michel Frome cita uma carta que Carson escreveu para um amigo, na qual ela afirma “Mas agora posso crer que pelo menos ajudei um pouco. Seria irrealista se acreditasse que um único livro causaria uma mudança completa”. “Poderia ser irrealista, mas a história comprovou ser verdadeiro”, disse o editor de Carson, Paul Brooks, em seu livro “Speaking for nature: how literary naturalists from Henry Thoreau to Rachel Carson”. 

“Primavera Silenciosa” mostra que é possível produzir jornalismo ambiental sério e de repercussão positiva, livre de aspectos político-partidários e comerciais, mas com uma postura em favor da vida. O que é necessário? Coragem, criatividade e se importar verdadeiramente com o sagrado direito à vida.
Fonte:
http://www.observatorioeco.com.br/50-anos-do-livro-primavera-silenciosa-um-tributo-a-rachel-carson/


O Espírito de Rachel Carson
Terry Tempest Williams
Escritora, naturalista e ativista ambiental.
Da revista Eco-21

Havia uma vez uma cidade no coração da América onde toda vida parecia viver em harmonia com seu ambiente. (...) Então uma estranha influência maligna se arrastou sobre a área e tudo começou a mudar. Algum encanto maligno havia se estabelecido na comunidade: misteriosas enfermidades eliminaram os bandos de galinhas; o gado e as ovelhas adoeceram e morreram. Por todo lugar havia uma sombra de morte. Os fazendeiros falavam de muita doença entre seus familiares. (...) Havia uma estranha calma. Os pássaros, por exemplo – onde tinham ido? Era uma primavera sem vozes. (...) Nenhuma feitiçaria, nenhuma ação inimiga havia silenciado o renascimento de nova vida no mundo afetado. As próprias pessoas haviam feito isso.

De “Uma Fábula para o Amanhã” de Rachel Carson

Quase 50 anos após o lançamento de Primavera Silenciosa, sua mensagem feraz e compassiva ainda vive. Rachel Carson. Ouvi seu nome pela primeira vez de minha avó. Eu deveria ter sete ou oito anos de idade. Estávamos observando pássaros – pintassilgos e outros – no jardim dos meus avós. “Imagina um mundo sem pássaros”, disse minha avó. “Imagina acordar sem o canto dos pássaros”. Eu não conseguia. “Rachel Carson” lembro-me dela dizendo: “Primavera Silenciosa”. E então ela e meu avô se engajaram numa discussão mais profunda enquanto minha mente tentava compreender o que minha avó havia acabado de dizer.

Charge de David Levine

Trinta anos depois, me encontrava num sebo de livros usados, em Salt Lake City. A lombada verde de Primavera Silenciosa me chamou a atenção. Eu puxei o clássico da estante e o abri. Primeira edição, 1962. Enquanto releio o texto, surpreende-me quão pouco mudou o livro: “Um dos exemplos mais trágicos de nosso ataque não pensado à paisagem está à vista nas terras de Artemísia do Oeste, onde uma vasta campanha está acontecendo para destruir a salva e substituir os pastos. Se uma empresa já precisou ser iluminada com um senso de história e significado da paisagem, é essa. (...) Ela está espalhada diante de nós como as páginas de um livro aberto no qual podemos ler por que a terra é o que é, e por que devemos preservar sua integridade. Mas as páginas jazem não lidas”. Ainda as páginas jazem não lidas. Com o Primavera Silenciosa nas mãos, eu me pergunto quantos de nós dentro da comunidade da área de conservação realmente já o lemos. Conhecemos o livro. Podemos falar de memória um resumo de duas frases de seu texto: “Toda vida é interligada. Os agrotóxicos entram na cadeia alimentar e não só ameaçam, mas destroem um meio ambiente saudável...”. E, no entanto, podemos ter perdido a riqueza da prosa.

Comprei o livro, o levei para casa, e o leio e releio de capa a capa. As palavras se tornam um sacramento honrando o corpo da Terra. Frágil. Delicado. Equilibrado. Em exemplo após exemplo, Rachel Carson tece um conto ambiental de amor e vida e perda. Andorinhas voando. Andorinhas mortas. Peixes nadando. Peixes de barriga para cima. O mundo envenenado que ela registra não é um mundo no qual eu gostaria de viver. Continuo lembrando a mim mesma que isso não é ficção – nem em 1962, nem agora. E eu me pergunto, o quanto mudou? Com cada capítulo identificando os horrores de agrotóxicos e hidrocarbonetos, a teia de vida que eles estão desemaranhando, estou atenta à resistência emocional e intelectual de Rachel Carson, sua habilidade de aguentar a dor da história que ela estava contando. Rachel Carson era uma mulher fervorosa. Uma alma gentil, direcionada, que acreditava na eloquência dos fatos. Ela amava tanto a linguagem quanto a paisagem. “Não consigo me lembrar de nenhuma época em que não estava interessada no lado de fora e em todo o mundo da natureza”, disse Carson. 

Escrever se tornou expressão de seu amor ao mundo natural. Ela publicou sua primeira história quando tinha 10 anos de idade, ganhando a Medalha de Prata da Saint Nicholas, uma revista infantil de grande prestígio. “Talvez aquela precoce experiência de ver meu trabalho impresso representou seu papel na nutrição do meu sonho de infância de me tornar uma escritora”, disse ela. Aqui estava uma jovem mulher já no seu caminho. Em 1928, ela se graduou magna Cum Laude na Faculdade da Pensilvânia para Mulheres (agora a Faculdade Chatham), com formação em zoologia. A força de seu curso de trabalho tanto na literatura quanto na ciência fornece evidência de sua dupla natureza – cientista e escritora. “Eu pensei que tinha que ser ou uma ou outra”, ela disse. “Nunca me ocorreu que eu deveria combinar as duas carreiras”.

Paul Brooks, editor e biógrafo de Rachel Carson, escreveu sobre ela: “A fundição dessas duas poderosas correntes – a imaginação e o discernimento de um criativo escritor com a paixão por fatos de um cientista – vai longe para explicar a mistura de beleza e autoridade que fazia seus livros serem únicos”. Ver o mundo como um todo – esse é talvez o maior presente de Rachel Carson para nós. Ela continuou sua educação como bióloga, recebendo um mestrado em zoologia na Universidade John Hopkins, onde estudou genética. Sua tese “O desenvolvimento do prônefro durante a vida embrionária e o início da vida larval do peixe-gato (Ictalurus punctatus)”, deveria suprimir a frequente crítica de que Rachel Carson era somente uma naturalista “amadora”.

Em 1936, ela aceitou um trabalho como bióloga marinha no Departamento Americano de Pesca (que mais tarde se tornou o Serviço Americano de Peixes e Animais Selvagens). Ali ela era capaz de fundir graciosamente seus talentos como cientista e como escritora, eventualmente se tornando chefe de publicações para o Departamento. No início de sua posse continuou lecionando cursos na Universidade de Maryland e na John Hopkins.

“Sob o vento marinho” foi publicado em 1941. “O mar ao nosso redor” foi publicado em 1951 e recebeu o Prêmio Nacional do Livro. “Se há poesia no meu livro sobre o mar”, ela disse, “não é porque eu deliberadamente a coloquei lá, mas porque ninguém podia verdadeiramente escrever sobre o mar e deixar de fora a poesia”. Quatro anos depois, em 1955, ela publicou “A Borda do Mar”, estendendo o mundo de seus leitores à intrincada vida das marés. Rachel Carson tinha se tornado uma autora estimada pelo público estadunidense. E então veio o Primavera Silenciosa.

Carson recebeu uma carta urgente de sua amiga Olga Owens Huckins, uma jornalista, que lhe pediu ajuda para achar pessoas que poderiam elucidar e falar sobre os perigos dos agrotóxicos. Os Huckins tinham uma pequena casa em Duxbury, Massachusetts, logo ao Norte de Cabo Cod, que eles haviam transformado num santuário para pássaros. Sem qualquer pensamento sobre os efeitos nos pássaros e animais selvagens, o Estado havia pulverizado toda a área para o controle de mosquitos. Olga Huckins mandou uma carta indignada ao Boston Herald em Janeiro de 1958. Um trecho: “O avião do controle de mosquitos voou sobre nossa pequena cidade no verão passado. Já que vivemos perto dos pântanos, fomos tratados com várias doses letais enquanto o piloto cruzava nossa região. E nós consideramos a pulverização de veneno ativo sobre terra privada uma séria intrusão aérea”. O “inofensivo” banho de chuveiro logo de uma vez matou sete de nossos amáveis pássaros canoros. Nós recolhemos três corpos mortos na manhã seguinte, bem na nossa porta. Eles eram pássaros que haviam vivido junto a nós, haviam confiado em nós, e construído seus ninhos em nossas árvores ano após ano. No dia seguinte, três deles estavam espalhados ao redor do bebedouro (eu o havia esvaziado e lavado após a pulverização, mas você nunca consegue matar DDT). (...) Todos esses pássaros morreram horrivelmente e da mesma maneira. Seus bicos estavam escancarados, e suas garras oblíquas estavam erguidas aos seus peitos, em agonia.

Olga Owens Huckins testemunhou. Rachel Carson respondeu. Quatro anos e meio depois foi publicado Primavera Silenciosa. Carson escreveu para Huckins dizendo que foi sua carta que havia “começado tudo” e a havia levado a perceber que “eu devo escrever o livro”. Uma correspondência entre duas amigas. Duas mulheres. Indivíduos defendendo os lugares que amam. Nunca podemos esquecer o poder de vozes fervorosas, informadas, contando sua história, testemunhando, manifestando-se em nome da terra.

Rachel Carson disse a verdade como ela a via. O mundo natural estava morrendo, envenenado pelas mãos da cobiça corporativa. Suas palavras se tornaram um catalisador para a mudança. Um debate havia começado: uma reverência à vida versus uma reverência ao poder. Através da força e da vitalidade de sua voz, Carson alterou o panorama político dos Estados Unidos. Loren Eisely escreveu que o Primavera Silenciosa “é um ataque devastador, severamente documentado, e implacável, sobre a falta de cuidado, a cobiça e a responsabilidade humana”. Nem todo mundo o via assim.

A empresa química Monsanto, se antecipando à publicação do Primavera Silenciosa, encomendou urgentemente uma paródia intitulada “O Ano Desolado”, para agir contra o ataque de Carson à indústria. Sua intenção era mostrar a pestilência e a fome que a companhia alegava que ocorreria num mundo sem agrotóxicos. Em seu boletim semanal, a Associação Médica Americana disse ao público como obter um “kit informativo”, compilado pela Associação Nacional de Químicos Agrícolas, para responder perguntas provocadas pelo Primavera Silenciosa. A revista Time chamou o Primavera Silenciosa de “injusto, unilateral e histericamente superenfático”, acusou Carson de assustar o público com “palavras atiçadoras de emoções”, e alegou que seu texto estava “simplificado demais e totalmente cheio de erros”. Solteirona. Comunista. Uma naturalista amadora que deveria apegar-se à poesia, não à política. Esses eram só alguns dos rótulos usados pra desacreditá-la. Rachel Carson, na verdade, havia tocado fogo no universo químico da América.

O Presidente John F. Kennedy viu as chamas. Ele tomou conhecimento do Primavera Silenciosa quando apareceu nas páginas do New Yorker. Numa coletiva com a imprensa, em 29 de Agosto de 1962, um repórter perguntou a Kennedy sobre a crescente preocupação entre os cientistas sobre os perigosos efeitos colaterais em longo prazo do uso de DDT e outros pesticidas e se o Departamento Americano de Agricultura ou o Serviço Americano de Saúde Pública estavam planejando ou não lançar uma investigação a respeito.

“Sim”, replicou o Presidente: “eu acho que particularmente, é claro, desde o livro da Srta. Carson”.

A mensagem de Rachel Carson havia infiltrado a ralé. O Painel das Ciências da Vida do Comitê de Aconselhamento Científico do Presidente foi encarregado de revisar o uso dos pesticidas. Em 1963, o Comitê emitiu um chamado para medidas legislativas para salvaguardar a saúde da terra e de suas pessoas contra pesticidas e toxinas industriais. O relatório do Presidente havia vindicado Carson. Suas poesias foram transformadas em política pública. Em 1967, cinco anos após a publicação do Primavera Silenciosa, o Fundo de Defesa do Meio Ambiente nasceu, com um mandato, nas palavras de um de seus fundadores, “para construir um corpo de Lei criada por precedência para estabelecer o direito de um cidadão a um meio ambiente limpo”. Três anos depois, em 1970, foi criada a Agência de Proteção Ambiental (Environmental Protection Agency - EPA).

E hoje nós temos uma nova geração de indivíduos carregando a tocha da vigilância. Pessoas como Lois Gibbs, a mulher que expôs o “Canal do Amor” ao público estadunidense como um tenebroso exemplo da arrogância e descuido da indústria quanto à saúde da comunidade. E Mary O’Brien, cientista da Aliança Mundial pela Lei Ambiental, que fornece dados científicos a advogados e cidadãos de zonas rurais, lutando para manter a integridade biológica de suas comunidades. E Pam Zahoran da Proteger o Meio Ambiente e as Crianças em Toda Parte, que assinou, junto com 22.000 outros cidadãos, uma petição contra um grande incinerador de resíduos perigosos a ser construído pelas Indústrias Waste Technologies em East Liverpool, Ohio. Elas nos mostraram o que significa cidadania responsável. Como Carson, esses indivíduos estão pegando os fatos e abastecendo-os com uma resistência veemente.

Rachel Carson nos lembra o que significa ser um guerreiro de coração: “Não, eu mesma nunca pensei que os fatos desagradáveis dominariam, e espero que não dominem. A beleza do mundo vivo, que eu estava tentando salvar, esteve sempre predominante em minha mente – isso, e a raiva às coisas sem sentido, brutais, que estavam sendo feitas. Sentia-me compelida a uma obrigação solene de fazer o que eu pudesse – se pelo menos não tentasse, nunca poderia estar feliz de novo na natureza”.

Não muito tempo atrás, visitei o Refúgio Nacional de Animais Selvagens Rachel Carson, um rico pântano de sal que se espalha em aproximadamente 1.900 hectares ao longo de 73 quilômetros na costa do Sul do Maine. Carson conhecia muito bem essa região. Enquanto eu andava através do santuário e escutava a límpida canção de melros de asa vermelha e assistia o vôo deliberado de grandiosas garças azuis, não podia evitar me perguntar, se Carson estivesse viva hoje, ela acharia esse mundo um pouco mais quieto? Eu teria adorado perguntar-lhe que preço ela pagou, pessoalmente, por sua condição de ser uma guerreira, no que se diz respeito ao Primavera Silenciosa. Posso imaginá-la olhando diretamente dentro de meus olhos e sorrindo sobre tal presunçosa pergunta, balançando a cabeça, e então olhando para fora, em direção ao seu amado mar. Eu a imagino dizendo “que escolha nós temos?”. 

Rachel Carson morreu de câncer de mama no dia 14 de Abril de 1964, aos 54 anos de idade. Antes de sua morte ela escreveu, “É bom saber que eu devo continuar vivendo mesmo nas mentes de muitos que não me conhecem e, grandemente, através de associação com coisas que são bonitas e amáveis”.

Agora quero lembrar o espírito de Rachel Carson. Quero ser tão feroz quanto compassiva ao mesmo tempo. Quero carregar uma raiva saudável dentro de mim e despedaçar a complacência que vazou para dentro de nossa sociedade. Quero conhecer a graça de coisas selvagens que sustenta a coragem. O escritor Jack Turner clama por uma “fúria sagrada”, uma fúria que está fundamentada no conhecimento sagrado de que toda a vida é relacionada. Podemos achar a coragem moral e a fúria sagrada dentro de nós mesmos para darmos um passo à frente e questionarmos cada Lei, pessoa e prática que nega justiça à natureza? Podemos continuar a testemunhar? Essa é a mensagem do Primavera Silenciosa. Carson nos diz, “A história da vida na Terra tem sido uma história de interação entre coisas vivas e seus ambientes”. 

Rachel Carson era uma mulher destemida: “Não tenho medo de acharem que sou uma sentimentalista quando digo que acredito que a beleza natural tem um lugar necessário no desenvolvimento espiritual de qualquer indivíduo ou qualquer sociedade. Acredito que sempre que destruímos a beleza, ou sempre que substituímos alguma coisa feita artificialmente pelo homem por uma característica natural da Terra, nós retardamos alguma parte do crescimento espiritual do homem...”.

Penso na minha avó. Penso nos pássaros. E penso naquela “cidade no coração dos Estados Unidos onde toda a vida parece viver em harmonia com seu ambiente...”. Percebo a inocência daqueles dias. Agora, a idéia de uma primavera sem cantos dos pássaros é de fato inimaginável. Rachel Carson nos convocou a agir. Suas palavras permanecem como um texto sagrado.


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