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segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Ecologia - Grandes Ecologistas - Miguel Abellá

Posto hoje sobre o uruguaio Miguel Abellá. Nome esquecido, mas foi um dos homens mais importantes da história do ambientalismo brasileiro. Uma dica aos pesquisadores em meio ambiente e educação ambiental no Brasil: sugiro, antes de se falar em grandes conferências de ONU sobre meio ambiente, e afirmar que foram essas conferências que divulgaram a questão ambiental, falar sobre aqueles e aquelas que muito tempo antes já falavam abertamente sobre meio ambiente. Miguel Abellá é um nome esquecido, e isso é um equívoco muito grande por parte de muitos daqueles que abordam a educação ambiental no Brasil.
A primeira parte é um trecho de minha dissertação de mestrado - tanto que as referências bibliográficas podem ser encontradas lá - e o segundo trecho é do site do IPEH (Instituto de Pesquisas em Ecologia Humana)

Miguel Abellá

www.ipeh.org.br

Artista plástico morador de São Paulo ficou conhecido nos anos 70 por fazer manifestos solitários e  silenciosos na grande metrópole paulistana, ao sair nas ruas fantasiado com uma máscara de proteção de gás e com cartazes e escritos: “ABAIXO A POLUIÇÃO!” 

Depois de ter passado muitos anos protestando contra o regime de Franco através de pinturas e poemas, foi para a Argentina em 1950 e para São Paulo em 1964. Protestou contra o plástico; contra o acordo nuclear Brasil-Alemanha; contra a exploração de madeira na Amazônia; contra a poluição de Cubatão e do sistema Tietê- Billings; contra o fim de Sete Quedas. Geralmente declarava seu amor aos animais e ao rio São Francisco:

Humanidade. Exerço a liberdade de protesto pela Carta das Nações Unidas pelo Direito dos Homens e pela Constituição Brasileira. Não resisto suportar esse mundo de ratos no seu esgoto, sem esse gesto de dignidade contra a abjeção submissa de uma sociedade fatalista, condenada e sem futuro. Onde está o homem, Diógenes? 
(ABELLÁ apud MARQUES, 2000)

Fundador do Movimento Arte e Pensamento Ecológico conseguiu uma legião de colaboradores entre artistas e ecologistas. Assim como Lutzenberger, suas críticas e observações continham um grande teor libertário e acreditava que a sociedade deveria lutar contra o fatalismo dos abusos tecnológicos, que deveriam ser civilizados em seus excessos.Ao ser punido por um professor com um bofetão, em sua adolescência na Espanha, por  não entender geometria e matemática, questionou a educação e a sociedade de maneira radical: 

“Naquele momento, desmistifiquei a autoridade, senti que a civilização, o progresso, a autoridade, esses conceitos tinham que ser revisados...” (URBAN, 2001, p. 74)

A revista “Pensamento Ecológico”, fundada pelo grupo, em seu primeiro número, mostrava no editorial o teor crítico e libertário de Abellá, ao discutir o modelo de desenvolvimento que era adotado no Brasil – com intenso consumo de combustíveis fósseis e energia atômica – e também retomava um debate caro aos libertários, que eram as soluções ao nível de pequenas comunidades.

Seus componentes criticavam também os padrões de consumo que eram trazidos pelas grandes empresas transnacionais e o conseqüente desenvolvimento da cultura de massas e da centralização – e concentração de poder – administrativa, econômica e política. Abellá pôs em dúvida, já na conferência Rio-92, o conceito de desenvolvimento sustentável do Relatório Brundtland, que foi enormemente divulgado durante a conferência, já que o julgava apenas mais uma forma de os países hegemônicos explorarem os do terceiro mundo, impondo-lhes noções, conceitos e exigências.

E algumas vezes, já no fim de sua vida, também como Lutzenberger, demonstrava um tom catastrófico em sua fala, ao perceber que a exploração dos recursos naturais e a despreocupação em relação ao meio ambiente estavam se acelerando:

Nosso progresso é unilateral, não é dimensional, não é verdadeiramente holístico. Para mim, assistimos ao fim da civilização. Sem ecologia humana, nem a ecologia biológica se salvará. (Ibidem, p. 75) 

Assim também como já aparentava grande desânimo em relação ao movimento ecológico brasileiro, o qual havia, em boa parte, se institucionalizado e perdido a noção de ação direta nas ruas:

Hoje, o movimento se fechou em capelinhas... os meios, o dinheiro, o poder, a tecnologia, se converteram em finalidades, e as finalidades não existem mais... falta a emoção da rua, a gente perdeu essa emoção porque os interesses econômicos são prioritários para os indivíduos da cidade moderna. (ABELLÁ, 2000, p. 130) 


www.ipeh.org.br

Emílio Miguel Abellá é o nome de um dos mais importantes ambientalistas que São Paulo já teve a honra de hospedar.
Artista plástico espanhol, chegou à cidade em 1964, trazendo na bagagem, além do talento como artista, a convicção contundente da importância da militância ambientalista.
Foi ele o protagonista de um dos mais famosos manifestos da história da metrópole quando, em 1973, vestido com um saiote e usando uma máscara de oxigênio, saiu pelas ruas com uma placa contendo reportagens sobre a poluição do ar em São Paulo. E isso não foi o começo. Já havia lançado as campanhas performáticas contra os contratos de risco para a exploração madeireira da Amazônia nos anos 70, contra a poluição de Cubatão e do Tietê-Billings e contra o fim das Sete Quedas. E as manifestações não pararam mais.
Fundador do Movimento Arte e Pensamento Ecológico, nos últimos tempos de vida, distribuía a todos uma simples folha verde de plástico, sorrindo e provocando: "guarde bem esta recordação do que estamos perdendo para sempre".
Morreu em junho de 2000, em São Paulo, e sua ausência comprometeu inevitavelmente o brilho das manifestações em defesa do meio ambiente desde então..
Patrono e um dos fundadores do IPEH, Abellá é mais que uma referência. É um símbolo do movimento ambientalista paulistano.

Confira a entrevista dada por Abellá à Revista Aldeia, publicada na edição de abril/maio de 2000.

"Eu concordo com Carlile, quando diz que a alma de todos os progressos é o progresso da alma"

Por Francisco da Silva e Nelson Pedroso*

Aldeia - o senhor chegou ao Brasil em 1964, e, após três meses, houve o golpe militar. Como ficou o ecologista, o pacifista, em pleno regime militar? O que o levou a sair às ruas do centro de São Paulo, fazendo o seu famoso protesto solitário?

Abellá - Em agosto de 1973, a poluição chegou a um tal nível na cidade que as rádios recomendaram à população se provir de colírios e evitar sair à rua com carro, porque a poluição podia até matar. A inversão térmica estava prevista para tida aquela semana. Eu disse: Chegou o meu dia. Agora eu vou demonstrar perante 10 milhões de testemunhas como o progresso é muito problemático, muito questionável. Eu concordo com Carlile quando diz que a alma de todos os progressos é o progresso da alma. Aos doze anos eu já falei que ia revisar o progresso, quando recebi um bofetão de um professor. Abaixei a cabeça, não de vergonha, mas de rebeldia. Então, naquele dia, em 1973, eu pensei: vou sair, vou criar um movimento, vou sair com uma máscara para combater a poluição, a ditadura tecnológica, dando um sinal às pessoas para que vissem também que se tratava de uma ditadura militar. Queria propor uma reavaliação de todo esse processo que, ao invés de levar o homem para o destino ao qual estava designado, o leva para o caos.

Aldeia - O que é a Ecologia Humana defendida por Abellá?

Abellá - Quando se fala em Ecologia, as pessoas só se preocupam com duas questões, a fauna e a flora. A sensibilidade planetária que eu vislumbro, no entanto, vai muito além desses dois fatores. O equilíbrio da natureza não se limita a eles. Em todo conflito, de qualquer ordem que seja, existem o agente ativo e o agente passivo. Com o agente ativo não nos preocupamos nunca, só com o agente passivo, a biosfera. E o culpado pela crise da biosfera quem é? Ela é provocada pela noosfera, a parte inteligente da terra. Então, não fazemos mais que transferir para a biosfera a parte crítica, insustentável, desequilibrada, caótica, apocalíptica, que é a noosfera. Nunca se enfocou esta parte, e esta é a preocupação da Ecologia Humana. Devemos considerar o Homem como o responsável pela crise e responsável também pela saída da crise. Veja você, a criação parece ser mais inteligente que o ser humano. A criação evoluiu de tal maneira, em suas diferentes etapas: mineral, vegetal, animal, vida racional, e colocou o ser humano no vértice da pirâmide e agora ele, do vértice, condena toda a pirâmide: a bomba atômica, a camada de ozônio, a água potável e a não potável, as florestas, as áreas cultiváveis, o ar nas grandes concentrações humanas onde vive mais de 60% da população humana. Globalmente, tudo caminha para a degradação. A natureza segui o seu rumo e o Homem o reverteu. Nas grandes megalópoles, o ser humano é um elemento decisivo, e de outro lado estão a flora e a fauna totalmente degradadas. Tem que englobar tudo isso. Penso que, sem a Ecologia Humana, nem a Ecologia Biológica sobreviverá. Se a gente não pode mais pensar pela emoção, vamos para a Ecologia Humana, a parte econômica, mental, lógica, global da Ecologia.

Aldeia - E como o Homem pode interferir novamente agora para voltar, senão a um equilíbrio, o mais próximo possível disso?

Abellá - Difícil, porque existe uma determinante maior que esta lógica que nós conquistamos, que é a dialética cósmica. Vimos o fim de várias civilizações, como a grega, a romana, a egípcia, só que agora isso não se restringirá a uma região. Eu estou convencido de que estamos no fim da nossa civilização. Vai chagar um momento em que, por saturação da dialética, a situação vai se reverter, vai haver um ressurgimento. Você observa em qualquer parte, qualquer fração, qualquer coisa que parece insignificante, como se dá uma unificação no ritmo descendente. Aquilo a que chamamos de progresso tem desenvolvido meios, mas não finalidades. Nós perdemos as finalidades. O progresso quer dinheiro, poder, tecnologia, que são os substantivos de nossa civilização atual. Mas não são finalidades. São simples meios, e nós navegamos para o vácuo. E você vê que os países mais desenvolvidos são os que mais exaltam esse caminho, os que mais se suicidam, porque na frente tem o vácuo que não tem sentido ou explicação. Das várias linhas de decadência, alguma pode ser a máxima, para fazer a humanidade refletir e retomar o desenvolvimento.

Aldeia - E quando chegarmos a esse ponto, teremos tempo de refazer essa história?

Abellá - Esta é a preocupação. Temos que chegar até onde exista retorno. Durante um grande período da história humana, houve retorno. Eu tento enxergar onde está a próxima ruptura do ser humano em sua relação com o meio ambiente, de uma sustentabilidade que realmente preza o Homem como parte do ecossistema. Enquanto caçador e coletor, ele era parte do meio ambiente, e era parte dessa reciclagem natural. Quando começou a construir os ambientes começou a haver uma ruptura, com a criação da agricultura aumentou o desequilíbrio ambiental. Hoje temos essa contraposição entre ambiente natural e ambiente construído. Cabe a nós questionarmos qual é, afinal, o papel do ser humano no ecossistema e para onde nós queremos ir.

Aldeia - O senhor vê a possibilidade de uma conscientização do ser humano no sentido de tentar reaver uma maior integração com o meio ambiente?

Abellá - Em primeiro lugar, a quantidade sempre foi inimiga da qualidade, e a pior poluição é a poluição humana. É como aquela experiência com ratos, na qual colocaram 50 ratinhos numa gaiola e 100 em outra, e aqueles que estavam em maior quantidade se eliminaram rapidamente. Uns poucos povos ficaram ricos, e o que cresce é a massa pobre na Terra. Está errado tudo isso, é uma condenação da espécie e de todo esse sistema. Então, temos que nos conscientizar a respeito da reprodução da espécie, dar mais atenção ao desenvolvimento espiritual também, já que o ser humano é um binômio espírito-matéria, e nossa civilização é muito materialista e aí ela trai a espécie, que é espiritual. Se você não respeita o desenvolvimento integral, se você resolve os problemas apenas parcialmente e não globalmente, acontece isso, a bomba atômica, outros meio de extermínio massivo, biológicos e climatólógicos. Nas grandes cidades acontece a mesma coisa. Basta ver São Paulo com todos os seus dramas.

Aldeia - O senhor acha que ainda existe um movimento ambiental, ou as pessoas estão isoladas, cada uma olhando para o próprio umbigo?

Abellá - Por um lado existe um pouco de fisiologismo, como em toda a parte, em toda a história, e de outra existe o dinheiro, distraidor, que desvia. Muitas entidades, por exemplo, receberam dinheiro de fora e traíram seus financiadores, porque não cumpriram seus compromissos, desonraram o movimento. Por uma coisa ou outra, aos poucos, se perdeu a emoção da rua, que é o combustível do movimento. A emoção se perdeu. A mídia também se deslumbrou no começo, e hoje manifesta-se apenas quando ocorrem grandes tragédias. A mídia é um elemento decisivo, mas também muito corruptor.

Aldeia - O senhor já disse que ainda estaria disposto a trabalhar para que a questão da Ecologia Humana e Urbana tivesse um mínimo de organização. Também disse que isso depende da intervenção de pessoas, não vai surgir de um movimento espontâneo. Como chegar nesses ecologistas, ambientalistas e formadores de opinião, que acabam por achar que os problemas são tão grandes, tão violentos, que ficam imobilizados?

Abellá - Eu comentei isso em um seminário. A teoria cansa e condena o movimento. Por isso, temos que atrelar a teoria à ações imediatas. Propus: vamos tratar desses assuntos, sim, mas porque não reurbanizarmos o Parque D. Pedro? Combinamos, e passou o tempo, e hoje está assim... A ação é fundamental. Mas como fazer isso? Eu acabei de entrar em um movimento que se chama Câmara Júnior Internacional. Dizem que é muito importante, participaram dele John Kennedy, Hiroito, o imperador do Japão, só entram pessoas de 14 a 40 anos. Eu entrei porque tem os que passam, e os poucos que passam são considerados eméritos. Eu propus arborizar São Paulo. Enquanto a OMS recomenda 12 metros quadrados de verde por habitante, aqui em São Paulo foram encontrados 4 metros, e a ritmo decrescente. Temos que reverter esse quadro. Na Assembléia Legislativa, se propôs para este ano um fórum sobre cidadania e meio ambiente. A ONU estabeleceu para este ano o cultivo da paz. Ecologia e paz. Paz com a natureza e paz com os homens é a mesma coisa. São desdobramentos que refletem uma mesma causa. Tudo isso são convergências. Estamos tentando engatar, coordenar, juntar tudo isso.

Aldeia - Não te parece que as ong's acabaram virando ilhas de pensamento ecológico ou mesmo empresarial, que não se preocupam em estabelecer alianças, enquanto a prática da ação ecológica é uma ação de solidariedade?

Abellá - Temos que ver a questão da Ecologia como algo que vai muito além das ong's. Ela deve ser uma preocupação que permeia toda a sociedade. Existem muitas entidades, correntes e instituições que ainda não foram cooptadas, encampadas, como as igrejas. Eu já preguei até que o assunto da Ecologia é tão profundo que é próprio de artistas e de intelectuais, por isso a gente criou o MAPE - Movimento Arte e Pensamento Ecológico. Porque a base de efeito multiplicador cada um deles tem. O artista tem conceitos, a sensibilidade. Um escritor, tem uma maneira de perceber as coisas, de expressar. O artista percebe, o intelectual percebe e entende. Então, bem focadas e sincronizadas essas coisas, quem sabe senão se poderia deflagrar esse processo, aos pouquinhos, sem impaciência, sem pretensão, sem nervosismo? A gente deveria conduzir mais o movimento pela parte espiritual, e não mecanicista, econômica, parcial, transitória. Eu acredito que esse processo vai vir, e talvez privilegiadamente no Brasil. Eu estou no Brasil porque é um país humanista, pacifista e espiritualista, como eu me sinto. Temos essas condições aqui, que podem vir a deflagrar uma verdadeira revolução na regeneração de tudo isso que está aí. Sou otimista, porque, apesar dessas épocas que são como epidemias, de uma ditadura sangrenta como são as ditaduras, e de uma democracia incompetente e corrupta, apesar disso, há um substrato aqui no Brasil, tem espiritualidade. Temos frustrações por todas a parte, mas nada ensina tanto quanto a dor. O ser humano não pode se negar a lutar, não pode se suicidar. Temos que encontrar uma saída, temos que fazer esse esforço.

Aldeia - E o museu da Ecologia, qual é a sua proposta? Ele já existe fisicamente?

Abellá - Todos os anos se perdem milhares de espécies por ano, sem registro. Pode ser uma coisa dessas? Se está empobrecendo a Terra. Qualquer dia vamos ter carências na saúde, porque faltou o remédio. Só a Ecologia Humana pode pensar nessas questões. Queremos partir do microcosmo e ir para os motivos da degradação humana. E, para fazer o Museu da Ecologia, o Brasil tem mais material que a Europa inteira. É uma obra grandiosa, e nós não vamos fazê-lo senão tivermos os quadros mais competentes em cada área. Para acelerar esse processo, estamos criando o Museu Virtual. Talvez o que não conseguimos de dentro para fora consigamos de fora para dentro. Nossa proposta é um museu global, transcendental. Queremos um museu descentralizado: aqui está o museu indigenista, aqui está o museu científico, aqui o museu da arte, aqui o dos insetos... Não vai ser um museu estático, vai ser dinâmico, alegre, aberto, mas extroverso que introverso, um museu da rua, uma antítese dos museus até agora.

*Francisco da Silva é coordenador da Regional São Paulo de Abrosco - Associação Brasileira das Comunidades Alternativas, e Nelson Pedroso é presidente da AGDS - Associação Global de Desenvolvimento Sustentável.

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